quinta-feira, 28 de setembro de 2017

À espera dos bárbaros - J. M. Coetzee

Titulo original: Waiting for the Barbarian
Ano de publicação: 1980
Tradução: José Rubens Siqueira
Editora Companhia das Letras / 2006
204 páginas

Os bárbaros irão atacar a cidade murada. Diante desse medo iminente, os que vivem no cidade cercada por muros amparam seus dias e suas esperanças, as equipes de soldados vão e vem ao sabor do que é deduzido sobre a movimentação dos misteriosos moradores nômades das montanhas, que, segundo eles, se revoltam pela posse dos civis "domesticados" nas suas terras. Nesse clima, um magistrado idoso que administra o forte há mais de 30 anos passa seus dias, percebe as mudanças e organiza seus pensamentos. Dois personagens no livro mereceram ser chamados por nomes: Joll e Mendel, talvez pela brutalidade ou por serem os mais bárbaros dos oficiais. 
O administrador é feliz com sua rotina medíocre de comer, dormir bem, ter amantes ocasionais, registrar as necessidades do forte. Uns bárbaros são capturados e, dentre eles, uma jovem que é torturada, que sai com várias sequelas, encanta o magistrado, que se contenta em lhe lavar os pés, o corpo, dormir junto sem conjunção carnal, sem compreender o que o atrai na mulher, até que decide leva-la ao seu povo bárbaro, numa viagem perigosa. Essa atitude o deixa sob suspeição junto aos militares, sendo preso e torturado. 
Escrito em primeira pessoa na voz do magistrado idoso, quando ele ficou perto da morte, a voz passou a ser de Mendel por poucos parágrafo, visão interessante do autor. 
Relata sobre a injustiça da tortura, sobre a agrura que é a luta dos homens de enfrentar o poder do Estado, a visão do inimigo oculto que tem passos não dados, mas interpretados que foram dados.
Um ótimo livro. Recomendo.

"Estou balançando suavemente no ar, me chocando contra a escada, me debatendo com os pés. O latejar em meus ouvidos fica mais lento e mais forte até ser tudo o que posso escutar. 
Estou vendo o velho, olhos apertados contra o vento, esperando que ele fale. A arma antiga continua apoiada nas orelhas do cavalo, mas não está apontada para mim. Tenho consciência da vastidão do céu em toda a nossa volta e do deserto."

"(...) Todos na cidade murada que agora mergulha nas trevas (escuto os dois toques agudos de clarim anunciando o fechamento dos portões) têm preocupação semelhante. Todos menos as crianças! As crianças nunca duvidam que aquelas grandes árvores em cuja sombra brincam lá estarão para sempre, que um dia vão crescer e ficar fortes como seus pais, férteis como suas mães, que vão viver, prosperar, criar seus próprios filhos e envelhecer no lugar onde nasceram. O que impossibilitou de viver no tempo como peixes na água, pássaros no ar, como crianças? A culpa é do império! O império criou o tempo da história. O Império localizou sua existência não no tempo recorrente do ciclo das estações, que passa sereno, mas no tempo recortado de ascensão e queda, de começo e fim, de catástrofe."
J. M. Coetze
Nasceu em 1940, na Cidade do Cabo, África do Sul. Viveu na Inglaterra, lecionou nos EUA, voltou à Africa em 1984, onde residiu até mudar para a Austrália, em 2002. Ganhou o NObel de literatura em 2003 pelo conjunto da obra.

segunda-feira, 25 de setembro de 2017

A vida que enterramos - Allen Eskens

Título original: The life we bury
Tradução Renato Marques e Alexandre Raposo
272 páginas
Editora Intrínseca 

Escrito pela voz de Joe Talbert, jovem universitário, recém saído de casa para estudar, deixando o irmão mais novo e a mãe alcoólatra, porém não isento de culpa.
Em uma disciplina da universidade, tem de desenvolver a biografia de alguém idoso e o único que conhecia era seu avô,  morto quando tinha 11 anos. Então vai a uma casa de repouso. Ali pessoas idosas abundam. Porém, o único consciente era um recém chegado à instituição, doente terminal de câncer, em liberdade provisória depois de 30 anos preso por estupro e assassinato de menor.
Apesar de chocado com a maldade de seu objeto biográfico, Joe começa a se interessar pela estória de Carl Iverson, partindo para uma investigação junto com sua vizinha e crush Lila, mesmo com a responsabilidade que sente pelo irmão Jeremy.
Um livro razoável,  quase passável. Previsível. 

"O filósofo Blaise Pascal disse certa vez que, caso você precise escolher entre acreditar ou não em Deus, é melhor acreditar. Porque se você acreditar em Deus e estiver errado.... bem, nada acontecerá. Você simplesmente morrerá no vazio do universo. Contudo, se não acreditar em Deus e estiver errado, então passará a eternidade no inferno, ao menos de acordo com algumas pessoas". 

"Diariamente somos cercados pelas maravilhas da vida, maravilhas além da nossa compreensão, e simplesmente a tomamos por certas. Naquele dia, decidi viver a vida em vez de apenas existir. Se eu morresse e descobrisse o paraíso do outro lado, bem, isso seria muito bom, muito legal. Mas se eu não vivesse a minha vida como se já estivesse no paraíso, morresse e encontrasse apenas o nada, bem.... eu teria desperdiçado a chance. Eu teria desperdiçado a minha única oportunidade de estar vivo."

Allens Eskens
Nasceu em 17 de março de 1963, Mankato, Minessota, EUA. Advogado criminalista,  este é seu romance de estréia.

Todos os belos cavalos - Cormac McCarthy

Ano de publicação: 1992
Editora Companhia das Letras
Páginas:280

John Glady Cole e seu amigo Rawlins, jovens de 16 e 17 anos, decidiram viajar para o México em busca de uma nova vida, aventuras, cada um com seu cavalo, fugindo de casa. No caminho, encontraram o mais jovem ainda Blevins, misterioso e esquisito garoto que os seguia na estrada, forçando sua presença, mesmo a contragosto de Rawlins. Logo Blevins ficou para trás e os dois seguiram, trabalham numa fazenda, amansaram cavalos, foram presos, mataram, Glady se apaixona pela filha do fazendeiro, Alejandra. Uma estória de amizade, trabalho, amor e perseverança.  Uma forma de escrever que não tinha me deparado ainda, onde descrever traços humanos físicos não é importante, mas as situações, num detalhamento quase teatral, surpreende.
Um bom livro. 

"Para que acha que serve cercar o cavalo desse jeito?, perguntou Rawlins.
Não sei, disse John Glady. Não sou cavalo."

"Ficou deitado no escuro pensando em tudo que não sabia sobre seu pai e compreendeu que o pai que conhecia era o pai que sempre ia conhecer. Não queria pensar em Alejandra porque não sabia o que vinha pela frente ou que seriedade teria isso e achava que ela era uma coisa que era melhor poupar. Por isso pensava em cavalos e pensar neles era sempre a coisa certa."

"Quando fiz dezesseis anos já tinha lido muitos livros e me tornado uma livre-pensadora. Em todos os casose recusava a acreditar num Deus que permitia a injustiça que eu via num mundo criado por Ele."

Cormac McCarhy nasceu em Providence, Rhode Island, EUA, 1933. Serviu nas forças aéreas, escreveu o primeiro livro em 1965. Depois mais nove.

quarta-feira, 20 de setembro de 2017

Emaranhados - Mary Balogh

[Sem dados técnicos no exemplar lido]
Um título perfeito para o livro. Ou seria melhor "ligeiramente emaranhados", apenas para seguir o gosto da autora?
Julian e David são irmãos, o primeiro adotado. Também por esse motivo David se sente responsável por ele e assume as coisas erradas que o irmão faz. Até dizer que um filho gerado seria dele. Ai Julian casa-se com Rebecca, mas David também a queria. Quando Julian morre, vítima de uma bala de David, este assume Rebecca e casam-se. Aí Juliam "dismorre" e tudo se complica. 
Uma sinopse pobrinha para um livro fraquinho.
Um romance de banca. 


A autora
Mary Balogh nasceu e foi criada no País de Gales. Ainda jovem, se mudou para o Canadá, onde
planejava passar dois anos trabalhando como professora. Porém ela se apaixonou, casou e criou raízes definitivas do outro lado do Atlântico.
Sempre sonhou ser escritora e tinha certeza de que, no dia em que escrevesse um livro, ele seria ambientado na Inglaterra do Período da Regência. Quando sua filha mais nova tinha 6 anos, Mary finalmente encontrou tempo para se dedicar ao antigo sonho. Depois de três meses escrevendo na mesa da cozinha, a primeira versão de sua obra de estreia estava pronta. Publicada em 1985, deu a Mary o prêmio da Romantic Times de autora revelação na categoria Período da Regência. Em 1988, depois de vinte anos de magistério, ela passou a se dedicar apenas aos livros. [Fonte: Editora Arquiro]

terça-feira, 19 de setembro de 2017

As sobreviventes - Riley Sager

Título original: Final Girl
Ficção norte-americana
Tradução Marcelo Hauck
Editora Gutemberg / 2017
336 páginas
Garotas remanescentes é o título dado a três mulheres que  sobreviveram a chacinas em massa. Quincy, Lisa e Samantha. A trama é narrada na voz da primeira, que, dez anos antes foi a única a sair com vida no massacre do Chalé Pine, onde seis amigos de faculdade foram assassinados.
Quincy não se recorda do momento das mortes, sofreu amnésia traumática, bloqueando até sua capacidade de pronunciar o nome do assassino, Joe Hannen. Julga ter superado a tragédia, com a ajuda primeiro dos comprimidos azuis, também de Cooper, o policial que a salvou e, por fim, do namorado Jeff.
Porém a morte súbita de Lisa desenterra o sofrimento que passou dez anos atrás. Com ela, Samantha, outra garota sobrevivente de outro massacre, que julgava desaparecida. Misteriosa e invasiva.
O livro prende, um suspense ágil, construção psicológica dos personagens bem caracterizada.
Um bom livro.

O autor
Riley Sager é o pseudônimo usado por Todd Ritter, nascido na Pensilvânia, Riley é escritor, editor e designer gráfico que agora mora em Princeton, Nova Jersey. Além de escrever, Riley gosta de ler, filmes e assar. Já escreveu e publicou em outro lugar com o nome verdadeiro. 
Em seu Twitter (@ToddAlanRitter), no dia 17 de julho de 2017 disse "sim, eu sou Riley Sager".

segunda-feira, 18 de setembro de 2017

A jaca do cemitério é mais doce - Maneol Herzog


Editora Companhia das Letras
2017
96 páginas
Ficção brasileira
Santiago Hernandez, um menino filho de duas mulheres que cresce percebendo que para se dar bem e com as mulheres e principalmente com Natércia, tem de aprender a dançar. E chega a casar-se com a moçoila, apesar da hereditariedade propensa a pulos fora de casa dela. E é o que ele desconfia que acontece.  Talvez até os gêmeos que ela abortou seria um dele e outro do ex-policial Vivaldo. Após a separação e morte de Natércia, ele se isola, sem saber o que seria real ou não.  E segue a lógica que se ele deseja o mal a alguém conseguirá matá-lo.
Manoel Herzog
Nasceu em Santos/SP em 1964, advogado, poeta e escritor.

Um pequeno favor - Darcey Bell

Título original: a simple favor
Editora Bertrand Brasil/ 2017
Tradução: Ana Carolina Mesquita
336 páginas
Ficção americana
A autora poderia fazer um pequeno favor à humanidade e não escrever mais.
Conta a estória de uma mãe-blogueira-viúva-carente, Stephany, que finalmente encontra uma mãe amiga, Emily. Quando essa dita amiga some, deixando o filho Nicky aos seus cuidados, entra em desespero e de desaparecida muda o status para morta. Consolando o recém viúvo e agora amigo Sean, acabam tendo um caso, juntando escova de dentes e os dois filhos num saco só, ou melhor, numa família só. Mas Emily, a mãe -amiga-desaparecida-morta não morreu. Quem morreu foi a irmã gêmea da dita cuja que ninguém sabia que existia, nem o marido-não-mais-viúdo-galinha.
Claro que não tinha morrido. Tudo era um plano para dar o golpe do seguro de vida e arreganhar uma grana boa. Plano do potente Sean e da desequilibrada Emily.
Tem nessa pantomima toda a mãe com alzheimer da mãe amiga Emily e o enfadonho e sem sentido blog da Stephany, a mãe -carente-enxerida-blogueira.
Essa coisa do blog merecia um parágrafo medonho de reclamação de minha parte. Afinal, a dita blogueira escreve tudo lá,  se dirigindo à famigerada raça mães como amigas e desabafa até sua vida incestuosa. Sim! A criatura teve um filho com o irmão e o marido mortinho nem sabia, mas fala no blog. "Meu irmão gostoso Chris é irresistível na cama".
E a autora Bell conta na voz de Stephany, Emily e Sean essa saga toda. Claro, a maioria das falas da primeira é como se escrevesse no chato blog.
A jamanta-autora ainda descreve que as gêmeas eram tão parecidas que até as digitais eram iguais. Faltou pesquisar direito, heim, Bell?
A morta volta viva pra casa, o marido sai; Stephany volta a ficar sem amiga mãe,  já que Emily a usou como peixe no golpe; fica no ar, ao findar as páginas, a insinuação que Sean ou Stephany ou ambos serão acusado de matar o investigador de seguro. A malévola Emily sai ilesa, mas também sai lisa.
Aqui jaz puro spoiller. Conto tudo e ainda o final para que não percam tempo lendo algo tão mal escrito, mal alinhavado e ruim.

Darcey Bell
Nasceu em Iowa, EUA, 1981. Professora e mora em Chicago, "Um Pequeno Favor" ´r seu primeiro livro publicado. 

quarta-feira, 13 de setembro de 2017

Dias de abandono - Elena Ferrante

Tradução: Francesca Cricelli
Editora: Biblioteca Azul / 2016
Título original: I giorni dell’abbandono
Romance italiano
Ler Laços me fez querer voltar a ler o que mais gostei de Ferrante: Dias de Abandono. Sei que irei reler este livro muitas vezes.
Podem enquadra-lo como clichê, previsível, mas amei Olga e sua desventura de mulher abandonada. Vestir a pele da personagem e viver a loucura de um amor imaginado roubado de si e a reconstrução do que se é será para mim um deleite. Chega quase à loucura, sentimos raiva de Mário, o marido que a troca por uma quase adolescente, raiva doa dois filhos pirralhos que não tem culpa,  mas ter nascido e complicado a vida já é uma boa culpabilidade. Olga é mais forte que muitas mulheres e, se ultrapassou seus próprios limites, há muitas razões humanas para desculpa-la.
Mário pode ser condenado por se apaixonar por outra mulher?  Não. A não ser a condenação que mora em nossas cabeças egoístas e pequenas. 
Um ótimo livro.  Leiam! Leiam!

"Talvez quisesse abandoná-los de verdade para sempre, esquecer-se deles, para depois bater a cabeça, quando finalmente tivesse reaparecido Mario, a exclamar: os seus filhos? Eu não sei. Eu perdi, acho: vi-os pela última vez há um mês, na pracinha Cittadella."

"Eu fingia que estava ocupada na cozinha, mas esperava ansiosamente que Mario passasse por mim e me esclarecesse quais eram suas intenções, se tinha ou não desfeito o balaio de gato que estava em sua cabeça. Ele, mais cedo ou mais tarde, chegava, mas sem vontade, e com um mal-estar, cada vez mais visível, ao qual eu me opunha, usando uma estratégia que havia criado durante as noites insones, ou seja, a encenação dos confortos da vida doméstica, tons de compreensão, uma calma exibida e acompanhada até por alguma brincadeira para aliviar."

"Certamente, tive de passar rapidamente a borracha por cima da sua fisionomia macia dos vinte anos, antes de recuperar o rosto ainda não maduro, cortante e ainda infantil de Carla, a adolescente que estivera no centro da nossa crise conjugal, anos atrás. Certamente, só quando a reconheci fui surpreendida pelos brincos, os brincos da avó de Mario, os meus brincos."

Elena Ferrante
Pseudônimo de uma escritora italiana, cuja identidade é mantida em segredo. Especula-se que seja uma tradutora ou até mesmo um homem.
Fonte: Wikipédia

terça-feira, 12 de setembro de 2017

Laços - Domenico Starnone

Título original: Lacci
Romance / literatura italiana
Tradução : Maurício Santana Dias
144 páginas
Editora Todavia / 2017

Case-se, porém nunca terá a certeza porque o fez, breve o sentimento mudará e será forçado a conviver por conta de filhos que lhe carregarão de culpa, herança maldita de todos os pais.
Assim Aldo, depois de 12 anos casado,  sentiu quando abandonou a família para viver uma paixão com Lídia. Vanda, a esposa abandonada, não tem conformação, além de carregar a obrigação dos filhos. Os filhos que presenciam todo o drama de uma separação e querem para si seu quinhão: responsabilidade de quem os pôs no mundo.
Assim o romance de Starnone nos deixa refletindo.
Dividido em três partes: o primeiro na voz de Vanda com 34 anos em forma de cartas a Aldo, 32, quando da separação dos dois, com muita revolta, sofrimento e desespero criado e real também. O segundo, Aldo diz sua versão em narrativa 42 anos depois, ele com 74 e ela com 76 anos, presente,  alternando com lembranças passadas, evocadas pela invasão da casa onde moram por vândalos que a deixou em desordem, retirando cartas e fotos já esquecidas de seus esconderijos. A terceira parte os filhos Sandro e Anna (sendo essa a primeira pessoa) responsáveis pela manutenção da casa dos pais enquanto eles fazem uma viagem para alimentar o gato Labes. Não se dão bem, mas o que foram na infância é mostrado na fase adulta.
Um bom livro, bem escrito, concatenação muito boa. Recomendo. 

"(...) É melhor não ter filhos. (...) A gente acaba fazendo mal aos filhos e, consequentemente, é preciso esperar que eles nos mais mal ainda."

Tanto eu quanto ela conhecemos a arte da reticência. Da crise de tantos anos atrás ambos aprendemos que, para viver juntos, é preciso dizer bem menos do que calamos. Funcionou. O que Vanda diz ou faz é quase sempre o sinal daquilo que esconde. E minha concordância contínua encobre que há décadas não temos nenhum tipo, absolutamente nada, de sentimento em comum.”
 
Domenico Starnone nasceu em 1943, em Nápoles,  atualmente vive em Roma. Escritor,  roteirista,  jornalista.
Há suspeitas que o escritor seja a misteriosa Elena Ferrante, identidade também atribuída a sua esposa, Anita Raja.