Ricardo encontra um diário escrito pela ex-mulher onde ela revela seu verdadeiro sentimento, pensamentos e suas traições. Após 4 meses de casamento, sai de casa e muda-se para o "cafofo", galpão que ele alugava para guardar os livros que não cabiam no apartamento dividido por ambos. A partir daí o personagem-narrador inicia um processo de decadência e cura. A forma de descrever-se no momento inicial era referir-se a si como se tivesse "perdido a pele", ou seja, em carne viva, frágil e que "só se morre uma vez", o aprendizado da experiência da separação.
O escritor faz a trama como a si mesmo, uma autobiografia de seu divórcio, onde estão presentes os momentos que escreveu contos à Revista Piauí sobre o tema que depois vieram a transformar-se no livro. Também fala de "O céu dos suicidas", já resenhado aqui no blog. Mas é uma obra ficcional, por mais verídica que nos pareça.
Como processo de cura, Ricardo escreveu e começou a praticar corrida, tendo como meta a competição anual São Silvestre de 2012 na cidade de São Paulo. Em suas insônias e crises, saía à noite, mesmo "sem pele", para caminhar ou correr até a exaustão, assim recuperando sua capacidade de dormir noites mais tranquilas.
As correspondências, o afastamento dos amigos, fofocas, repercussão na imprensa (bem criticada, mas rematada ao final), já que a ex-mulher era jornalista,
"Divórcio" é um livro sobre o livro. O processo de tê-lo escrito, sendo ele mesmo, tal qual um diário, com repetições que ocorreriam em um escrito pessoal e enxertado depois, um processo de cura e recuperação da pela perdida. O livro é a cura do Ricardo-personagem-narrador.
O escritor faz a trama como a si mesmo, uma autobiografia de seu divórcio, onde estão presentes os momentos que escreveu contos à Revista Piauí sobre o tema que depois vieram a transformar-se no livro. Também fala de "O céu dos suicidas", já resenhado aqui no blog. Mas é uma obra ficcional, por mais verídica que nos pareça.
Como processo de cura, Ricardo escreveu e começou a praticar corrida, tendo como meta a competição anual São Silvestre de 2012 na cidade de São Paulo. Em suas insônias e crises, saía à noite, mesmo "sem pele", para caminhar ou correr até a exaustão, assim recuperando sua capacidade de dormir noites mais tranquilas.
As correspondências, o afastamento dos amigos, fofocas, repercussão na imprensa (bem criticada, mas rematada ao final), já que a ex-mulher era jornalista,
"Divórcio" é um livro sobre o livro. O processo de tê-lo escrito, sendo ele mesmo, tal qual um diário, com repetições que ocorreriam em um escrito pessoal e enxertado depois, um processo de cura e recuperação da pela perdida. O livro é a cura do Ricardo-personagem-narrador.
Publicações na revista Piauí:
Trechos:
"Uma caminhada longa causa dor nas pernas, um peso nas coxas e o coração acelera. Estou vivo, portanto. Como meu corpo não tinha pele, eu passava o tempo inteiro conferindo meus ossos e os órgãos mais importantes. Respirar fundo não traz apenas fôlego: meu pulmão está aqui."
"No final da segunda semana após o divórcio, resolvi ir ao lançamento de um livro. Por causa do meu rosto sem pele, estava com receio de encontrar pessoas conhecidas, mas achei que uma livraria talvez me distraísse um pouco. Em Budapeste, ouvi um burburinho nos fundos do corredor de literatura e, curioso, descobri um grupo de pessoas ouvindo uma aula sobre O homem sem qualidades de Robert Musil. O professor, no inglês impecável dos não falantes muito cultos, convidou-me para sentar, mas, com a desculpa de que não entendo húngaro, recusei. Achei aquela reunião tão charmosa quanto a barraquinha de livros na feirinha de antiguidades de Amsterdam. Preciso voltar à Holanda. Acho que não entendi direito o país de Van Gogh."
"Em Berlim, ganhei a aposta que tinha feito comigo mesmo: sete dias sem abrir a boca, comunicando-me apenas por gestos. A solidão absoluta me trouxe, quando eu tinha vinte e sete anos, um grande prazer. Na estação Lichtenberg acabei iludido. Ali parado, anotando tudo o que via (a roupa das pessoas, por exemplo) e depois recortando imagens de um número qualquer da revista Der Spiegel, achei que o mundo todo estava em silêncio. Quando o trem chegou, não ouvi nada. Fiquei sentado na plataforma até a sexta composição partir. Adoro trens. Então voltei para o hotel, na antiga parte socialista, a pé. Berlim tem uma arquitetura incrível."
"Comecei a intuir o que aconteceria nas próximas semanas: a confirmação de que existe um estrato social no Brasil, amplo e enraizado em espaços que vão do jornalismo ao direito, passando por setores da produção cultural, que referenda o antigo diagnóstico de sermos um país de gente corrupta, mentirosa, covarde e hipócrita. Aqui, o sexo é a moeda de troca mais comum. Não é à toa que os estrangeiros nos enxergam como um país lúbrico e burro."
"O comportamento da minha ex-mulher depois do divórcio, apesar de completamente desastrado, indica muito cálculo. Ela não sabe matemática direito, mas mesmo assim inventa equações. Eu descobri o rosto da pessoa com quem casei assim que ela o mostrou para mim. Talvez o meu erro seja fazer a pergunta: por que não percebi antes?"
"Agora, depois de uma pancada sob a forma de diário kitsch, já sei que não sou nada de mais. Minha vaidade era tão grande que precisei perder toda a pele para me livrar dela."
"Hoje sei que estou estruturado de novo, embora tenha que sempre viver com uma lanterna no bolso: não quero ter outro surto. O corpo sente muita dor quando está sem pele. O ideal é morrer só uma vez.
"Precisarei de contenção daqui em diante. É quase uma condenação. Quem ficou louco uma vez está mais perto da segunda. Agora, percebo outra perda causada pelo meu primeiro casamento: o ímpeto que me trazia bastante fôlego. Para respirar de novo, precisei correr. Obrigado, transtornada. Já estou com raiva de novo."
"A única pessoa real exposta neste livro sou eu. Não havia como ser diferente. Estava sem pele e qualquer máscara doía demais. No primeiro mês fora de casa, suava o tempo inteiro. Se tivesse me coberto, talvez me sufocasse. Uma pessoa com tanta falta de ar precisa sair para um espaço aberto."