terça-feira, 29 de setembro de 2015

O Céu dos suicidas - Ricardo Lísias

lRoberto tem 34 anos, não aceita o suicídio do Amigo André, que sofria de distúrbios psicológicos, passando a se questionar se quem comete suicídio iria para o céu. A angústia e ansiedade transportam o especialista em coleções a uma espécie deportador da Síndrome de Tourette, sem controle quando contrariado, gritos em plena rua, choros compulsivos, insônia, agressão... acompanhar a mente inquieta de Ricardo é entrar num túnel escuro com uma vela no fim do uso, quando o líquido quente cai nas mãos, provocando uma dor, porém dor na alma.
As repetições de pensamento, as descrições de passado, indo de imediato, logo depois, para o presente, é como viver na mente frágil e desorientada do personagem.
Apenas lendo esse exemplar que amei devorar (eu o fiz em um dia apenas), sabe a viagem que ele proporciona. Irei à caça de mais obras do autor, mais um que acompanharei de agora em diante.
Trechos:
"Não me incomodava ficar sozinho. Um colecionador cultiva com muita intensidade o mundo interior. Depois, mudei bastante. Na faculdade, eu era um daqueles caras sociáveis que conversam com todo mundo e não têm dificuldade para fazer amigos. Alguns estão entre os mais importantes da minha vida."
"(...)confesso que tenho medo de não aguentar. Estou incomodado com os acessos de ansiedade que começaram desde que vim para cá. Quando surgem, sinto o impulso de voltar a todos esses lugares. Durante o mais forte, fiquei a três quarteirões da velha república e me sentei em um banco, na rua, com muita vontade de chorar. Depois voltei para cá, envergonhado. Outra sensação incômoda é o nervosismo. Talvez eu devesse largar tudo, voltar para São Paulo, pedir desculpas para a velhota da árvore genealógica e procurar a tal “ajuda especializada”. Sinto saudades de tudo e isso me irrita."
"Sentir saudades de tudo não é exatamente saudosismo. Esse último gera aquele desejo ridículo de ficar relembrando todo tipo de coisa. A reconstrução sempre vem acompanhada de um sorriso frágil. No meu caso, sentir saudades de tudo é ter vontade de refazer qualquer coisa que retorne à minha cabeça."
"Todo dia, vou para a cama com medo de ter insônia. Consigo até perceber os meus batimentos cardíacos sem fazer nenhuma concentração. Deito-me, cubro todo o corpo, fico imóvel no escuro e meu coração dispara, com medo de não dormir. Preciso de um tempo para me acalmar. Depois, se me esticar com o corpo virado para o lado esquerdo e tiver alguma sorte, consigo adormecer. Mas é um sono bem leve. Quase um cochilo."
"(...)comentei que, com aquela idade, Ele com certeza sabia rezar.
— Claro que sei. Vou te ensinar: feche os olhos, afaste a ansiedade e acalme o corpo.
Perguntei então o que devia falar depois disso.
— Nada. É só fechar os olhos, controlar a ansiedade e acalmar o corpo. Esse é o jeito correto de rezar, garantiu-me.
Perguntei como devo fazer para controlar a ansiedade e Ele apenas respondeu que é possível. Tentei e, para minha surpresa, meu corpo continuou muito forte. Acho que consegui rezar. Depois de passar uns dois minutos sem nenhuma ansiedade, perguntei-Lhe por que Deus quer que a gente reze assim.
— Porque Ele é muito velho."