terça-feira, 29 de setembro de 2015

Limite Branco - Caio Fernando Abreu

lEscrito em primeira quando em forma de diário e em terceira pessoa, Maurício, jovem solitário, sem amigos, perdido em pensamentos existencialistas, dúvidas sobre a sexualidade, tido como o alter-ego do escritor Caio Fernando Abreu,  primeiro livro do escritor. Empolga e dificilmente alguém cuja adolescência tenha sido um tanto isolada e cheia de questionamentos, (des)construção de heróis,  senso de observação, sensibilidade, identificar-se-á com o personagem.
Lê-se de um fôlego só, fácil e leve. Excelente livro.
Passagens:
"Fico pensando se viver não será sinônimo de perguntar. A gente se debate, busca, segura o fato com duas mãos sedentas e pensa: 'Achei! Achei!', mas ele escorrega, e espatifa em mil pedaços, como um vaso de barro coberto apenas por uma leve camada de louça. A gente fica só, outra vez, e tem que começar do nada, correndo loucamente em busca dos outros vasos que vê. Cada um que surge parece o último. Mas todos são de barro, quebram-se antes que possamos reformular as perguntas. E começamos de novo, mais uma vez, dia após dia, ano após ano. Um dia a gente chega na frente do espelho e descobre: "Envelheci". Então a busca termina. As perguntas calam no fundo da garganta, e vem a morte. Que talvez seja a grande resposta. A única."
"Minha lâmpada de cabeceira está estragada. Não sei o que é, não entendo dessas coisas. Ela acende e, sem a gente esperar, apaga. Depois acende de novo, para em seguida tornar a apagar. Me sinto igual a ela: também só acendo de vez em quando, sem ninguém esperar, sem motivo aparente. Para a lâmpada pode-se chamar um eletricista. Ele dará um jeito, mexerá nos fios e em breve ela voltará a ser normal, previsível. Mas e eu? Quem desvendará meu interior para concertar meus defeitos?"
"De repente, sem pretender, respirou fundo e pensou que era bom viver. Mesmo que as partidas doessem, e que a cada dia fosse necessário adotar uma nova maneira de agir e de pensar, descobrindo-a inútil no dia seguinte - mesmo assim era bom viver. Não era fácil, nem agradável. Mas ainda assim era bom. Tinha quase certeza."
"Covardia é uma palavra feia. Receio de enfrentar a vida cara a cara. Descobri que não me busco ou, se me busco, é sem vontade nenhuma de me achar, mudando de caminho cada vez que percebo uma luz. Fuga, o tempo todo fuga, intercalada por períodos de reconhecimento. Suavizada às vezes, mas sempre fuga"