segunda-feira, 28 de setembro de 2015

A Romana - Alberto Moravia

Narrado em primeira pessoa e ambientado na Itália, durante o regime fascista, entre 1922 e 1945, mas não especifica o ano dentro desse período. Em Roma, Adriana, uma jovem de 18 anos, bonita, filha de uma camiseira, pobre, ingênua, romântica, inexperiente, crédula, é levada pela mãe a servir de modelo para posar para pintores e desenhistas. Conhece Gino, um chofer que a seduz e promete casamento. Adriana crê na bondade do noivo, apaixonada, vendo-o como perfeito.
"Esses pensamentos me surpreenderam e quase me assustavam, porque encontrar a perfeição não acontece todos os dias. Que homem é esse, perguntava a mim mesma, que, por mais que procure, não revela nenhuma mancha, nenhuma falha? Na realidade, sem perceber, tinha me apaixonado por ele. E todos sabem que o amor é um visor através do qual até um monstro parece fascinante"
Conhece Giselle, uma também modelo, prostituta, que a apresenta a Astarita, um alto funcionário da polícia, apaixonado por Adriana. Armando uma situação de encontro entre eles, entrega-se e recebe dinheiro pelo seu ato.
"o sentimento que me invadiu naquele momento me surpreendeu, e nunca mais, nas vezes todas em que recebi dinheiro dos homens, voltei a senti-lo com tanta clareza e sensualidade: um sentimento de cumplicidade e de entendimento sensual muito mais vívido do que todas as carícias que ele tinha me feito(...)"
Descobrindo o verdadeiro caráter do noivo, decide prostituir-se, seguindo inclusive o pensamento da mãe, que esperava uma vida melhor dada pela beleza da filha. Opera-se uma mudança em Adriana, com sua nova profissão, chegando a analisar cada cliente, traçando o perfil de cada um. Continua a encontrar-se com o ex-noivo, pois...
"...apesar de tudo ainda o amava, e não queria que esse fim fosse repentino e desagradável. Nunca gostei de cortes brutais, das interrupções abruptas. Acho que na vida as coisas morrem por si mesmas, como nasceram, do tédio, indiferença, ou mesmo por hábito, que é uma forma de tédio fiel; e gosto de vê-las morrer assim, naturalmente, sem culpa minha ou de outrem, cedendo aos poucos seu lugar a outras. Afinal, na vida nunca ocorrem mudanças claras e decididas, e quem quiser mudar com precipitação corre o risco de ver ressurgir, quando considerava extirpados de um só golpe e definitivamente. Eu queria que também a carícia das mãos de Gino me deixassem indiferente como suas palavras, e temia que, se não desse tempo ao tempo, ele pudesse ressurgir a qualquer momento, obrigando-me, contra minha própria vontade, a reatar as antigas relações"
Essa verdade, percebida por Adriana (pensamento que deveria ser exemplo para superar qualquer relação: exaurir-se dele), fez com que superasse seu amor, sem ódios ou rancor por Gino.
Daí ela apaixona-se por um cliente, entre outros tantos acontecimentos que fizeram a personagem crescer, mudar, desenvolver sentimentos que nem imaginaria existir.
Durante a narrativa, a personagem-narradora, narra de forma histórica-cronológica, analisando os fatos passados, dando a real dimensão do momento vivido.
Excelente livro, a trama psicológica traçada, acompanhado pela auto-análise, auto-conhecimento, nos lembrar um romance Machadiano.
Outras passagens:
"... a meu ver é impossível amar uma mulher e não respeitá-la, mas nele amor e crueldade pareciam misturar-se, um emprestando à outra a própria cor e a própria força"
"Pensava com profundidade crescente, até quase não pensar mais de todo, bastando-me sentir-me viva, após tanta dispersão e tantos hábitos angustiantes"
"Naqueles momentos de solidão, chegava sempre um momento de intensa perturbação, no qual parecia ver de repente, com gélida clarividência, toda a minha vida e a mim mesma de todos os lados e toda de uma vez"
"Eu continuava sendo a Adriana de sempre, com o mesmo temperamento, que levava homens para casa por dinheiro e andava com Gisella e falava de coisas sem importância com a própria mãe e com os outros. E às vezes me parecia ser estranho ser tão diferente, quando estava sozinha, de quando estava acompanhada; na minha relação comigo mesma e com os outros. Mas não me iludia com ser a única a ter sentimentos tão violentos e tão desesperados. Pensava que podia acontecer a qualquer um, pelo menos uma vez por dia, sentir a própria vida reduzida a um ponto de angústia, indizível e absurdo."
"Alguém pode pensar que é muito confortável aceitar um destino ignóbil mas rendoso em vez de recusá-lo. Mas muitas vezes perguntei a mim mesma por que a tristeza e a raiva habitam tão frequentemente a alma dos que querem viver de acordo de acordo com determinados princípios ou ater-se a certos ideais, enquanto os que aceitam a própria vida, que é sobretudo nulidade, anonimato e fraqueza, são frequentemente alegres e despreocupados. Aliás, nesses casos, cada qual obedece não a conceitos, mas ao próprio temperamento, que em tal modo toma o lugar do próprio destino. O meu, como já disse, era o de ser, a todo custo, alegre, doce e sossegada; e eu o aceitava"