segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Aqui estamos todos nus - Fernando Sabino

Três histórias que relatam a nudez da alma, a nudez física e a do encontro. Na primeira, temos quase arrancado do livro do mesmo autor, "Encontro Marcado", uma passagem em que o personagem principal é testemunha de um suicídio, vendo um corpo caindo de um quarto de hotel acima de onde se encontra, amortecida a queda numa marquise e caído ao chão. Aí trata-se de uma passagem na composição do todo que é o livro, ao passo que em "Aqui estamos todos nus", torna-se idéia predominante para o personagem, tendo revelações finais, a nudez da alma, o arrependimento e a dor da morte.
Na segunda história - hilariante, por sinal - o autor usa de um pesadelo individual de encontrar-se nu em plena cidade do Rio de Janeiro, perseguido e tomado por marginal, fugindo de seus perseguidores, para despojar sobre a hipocrisia social da não aceitação do nu, onde a falta de vestimenta toma pra si o poder de transformação pessoal. Bem, não sou defensora do nudismo, mas a história nos deixa pensar....
A terceira e última passagem do livro, percebemos a nudez da imbecilidade humana, mostrada que, quando trata-se do outro, que é pobre, maltrapilho, sem instrução, é-nos fácil ignorar; porém, quando esse pobre é possivelmente um "nosso", a perspectiva e os pontos de vista mudam drasticamente. Aí encontramos a nudez da descoberta, reencontros.
Passagens do livro:
"...Teria de se vestir para provar que era normal, soltar a esconder sob a roupa o atributo de sua condição de homem, para ser aceito pelos outros homens. Mas foi como Deus criou o homem e a mulher - sabia o trecho de cor: 'Estamos nus e disso não se envergonhavam'. Só tiveram consciência de sua nudez depois de tentados pela serpente a comer o fruto da árvore da vida e conhecer a ciência do bem e do mal. 'Então Deus fez para eles umas roupas de peles e os expulsou do Éden.' "
"Eu não era médico bem-sucedido coisa nenhuma. Apenas sabia disfarçar a mediocridade - a minha insegurança como clínico, em matéria de diagnóstico, por exemplo, era humilhante. A consciência da precariedade da medicina era cada vez maior: eu estava convencido de que noventa por cento dos males não tinham cura e dez por cento se curavam por si mesmos. E minha falta de vocação para aquela carreira era total - o que eu desejava ardentemente quando jovem, e por vergonha nunca havia confessado nem a mim mesmo, era vir um dia a ser escritor"