segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Os Servos da Morte - Adonias Filho

O autor, em "Os Servos da Morte", deixa-nos, ao findar a última página do livro,  o sentimento da crueza e brutalidade do ser humano, vingativo, mau, louco. Um mergulho na escuridão da solidez humana e seus mais diabólicos instintos.
Ambientado na Bahia, o livro se inicia num tempo futuro, com Paulino Duarte, pai de 5 filhos, viúvo, já cego e velho, recebe a notícia do filho Quincas que trará à casa, onde apenas homens moram, traria sua futura esposa, Celita. Aquela notícia desperta sua ira, trazendo lembranças amargas de quando sua esposa, Elisa, era viva.
O sentimento que os filhos têm pelo pai e entre si é medo, indiferença, rancor. Brutos, quase animais.
Após essa breve passagem da notícia que Quincas casaria, o livro retorna a Elisa, quando viva, que odiava o marido, com quem casou para salvar a irmã e a mãe da miséria, mesmo sabendo o que as pessoas falavam dobre Paulino Duarte: um louco, nocivo, incapaz de um gesto de bondade. Tem repulsa por ele e  era espancada.
Os filhos eram a réplica do pai: brutos e com a mesma ferocidade. Repudia-os, odeia-os.
A herança da "maldição" vinha do pai de Paulino Duarte, Miguel Duarte, bêbado, que tivera o filho com Lica, uma mulher errante. Ele e Juca Pinheiro, um empregado, tramaram a morte de Lica em seu parto. O filho foi criado errante pelos campos, junto aos cães, alimentando um ódio e sentimento de vingança, até encontrar Elisa, que o seduziu com propósito definido.
A herança passada para os filhos, Elisa sente sua ira aumentar e imagina que sua vingança seria a morte de Paulino Duarte, mas sua vingança seria maor: teria um filho com outro homem, para que Paulino tivesse o mesmo sofrimento que vira no pai, quando acusara D. Mariana, sua mãe, que Elisa não seria filha dele.
Nasce Ângelo. Tomado pelo sentimento de vingança da mãe, sente-se instrumento da dela, doente, delirante, tido como amaldiçoado e louco.
A teia de vinganças, traições, torturas, morte continua no decorrer do livro, numa sucessão de tragédias.
Diria que a tetricidade de  "Os Servos da Morte" nos abate, mas nisso está a capacidade magistral do autor: inspirar sentimentos diversos, mexer com as vísceras do leitor. Merece ser lido.
Thereza da C. A. Domingues, escritora, escreveu um livro interdisciplicar chamado "As Múltiplas Faces de Os Servos da Morte", fazendo uma releitura mítica do romance de Adonias Filho.
Passagens:
"A vida sempre acaba por transformar os covardes em bêbados ou suicidas"
"Coisas existem na nossa vida infalíveis como a própria morte: tarde ou cedo acabam por chegar um dia. Precisamos guardá-las con insensibilidade, quase como desprezo, pera vencê-las ou por elas sermos vencidos."
"Na manhã de cada dia sempre há promessa de nova experiência. O próprio ato de morrer não constitui experiência, a última experiência?"
"Como sombra infinita, obscurecendo a sua alma, pesando no seu corpo, a estranha idéia de que a paz estava no crime. Deveria pousar as mãos no cadaver de Paulino Duarte, sentir-lhe o sangue parado, o roxo da podridão cobrindo os lábios, para que pudesse adquirir paz. Paulino Duarte deveria morrer. Morrer como o mais abjeto de todos os doentes, o rosto deformado. Elisa sorria, o lúgrube riso dos que encontram vitória na mais degradante baixeza."
"Sim, o sofrimento está em tudo. Há uma tragédia viva em todas as coisas vivas do mundo, no pó dos caminhos, na quietude dos arbustos, no canto das aves!"